segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

MEU ÍDOLO GARFIELD
AMO GATOS.Amo suas vibrissas, que, quando criança, cortava, pensando estar fazendo a barba do bicho. Suas unhas,que já me retalharam de cima a baixo (nunca deixei de pegar um sequer no colo,mesmo os ariscos ou sarnentos). Amo os dentes afiados.
O andar deliciosamente rebolante (cresci tentando imitá-los e hoje rebolo tanto que parece que vou desconjuntar).Amo a maneira como se lavam,o modo como dormem,encolhidos.Os grandes olhos amarelos.Mas o que mais amo é o que muita gente odeia : a personalidade.
Eles não precisam de você,ou de mim,pra dar comida,arrumar umagata gostosa ou se distrair.Sabem muito bem viver sozinhos,masofere- cem o prazer de sua companhia.
Se estivermos à altura,é claro.
Gatos só se deixam "criar" por pessoas pelas quais têm o mínimo de respeito (você costuma ver mendigos ou bêbados com gatos de estimação?). Independentes.
Eles nos olham como se fôssemos completos imbecis - que somos - quando balbuciamos alguma estupidez do tipo "Xaninho,vem com a mami": ora,já que vamos abrir o bocão,que seja para algo que preste.Ou os deixemos dormir em paz,que o sono é sagrado,meu amigo.Cínicos.
Amo no gato a suprema indiferença e a distinção com a qual ele passa dos salões aos telhados.Elegantes.Pouco importa se moram num lixão ou numa almofada fofa,os gatos satisfazem-se com o que são e não precisam ir ao pet shop colocar lacinho e perfume pra serem aceitos.
Não admitem humilhação : que gostem deles do jeito como são ou os esqueçam,porque pra eles tanto faz.
Charmosos.Nunca se vêem gatos transando,muito menos atracados no meio da rua,de bando.São amantes noturnos,discretos.O máximo de participação que nós temos no ritual é auditiva - ou líquida,quando os mais babacas jogam água pra apartar.E,mesmo aparecendo sem um pedaço da orelha no dia seguinte,aquele olhar sacana vale a noite de sono perdida com a gritaria.É impossível se zangar com um gato.
Eles não fazem festa quando chegamos em casa,não babam com o linguão pra fora ou rolam pelo chão,mas sabem direitinho quando esta- mos tristes.Daí chegam,como quem não quer nada,sobem no nosso colo, ronronam (ah,como adoro esse barulhinho!),dormem um pouco e vão embora.Não são disponíveis nem estão ao alcance da mão todo o tempo,é certo,mas quando um gato está com você pode ter certeza de que ele não gostaria de estar em mais nenhum outro lugar.E nem faz aquilo por hábito ou obrigação.Diferentemente dos cães,gatos não querem ter um dono,e sim compartilhar bons momentos.Honestos.
Conviver com eles requer maturidade.Não são traiçoeiros,são li- vres.Nunca bajulam.São autênticos,por isso são difíceis.É muito mais fácil lidar com mentiras gentis,babação de ovo,puxação de saco,não é? E agora não me refiro só a felinos...
Gatos são muito parecidos com os humanos,por isso tanta gente os odeia: sabemos tão pouco lidar com eles como conosco mesmos.Pa- recidos,mas melhores : não mentem,não têm hierarquia,não fingem gostar de crianças,não sorriem quando na verdade querem te estraçalhar.São rancorosos (experimente maltratar um deles e,inadvertidamente,cruzar com ele de novo),preguiçosos,sedutores,imprevisíveis.Enigmáticos,interessantes, sagrados.Defeitos e virtudes no ponto certo.
Gatos seriam homens perfeitos.
Por Ailin Aleixo

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Porque Deus amou o mundo de tal maneira
que deu o seu Filho unigênito, para que todo
aquele que nele crê não pereça, mas tenha
a vida eterna.
João 3:16
Amar

Que pode uma criatura senão,
senão entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.


Carlos Drummond de Andrade

Carlos Drummond de Andrade


Itabira do Mato Dentro [Itabira] MG1902/10/31 - 1987/08/17BrasilÉpoca:Modernismo (Segunda Geração) Carlos Drummond de Andrade (Itabira do Mato Dentro [Itabira] MG, 1902 - Rio de Janeiro RJ, 1987) formou-se em Farmácia, em 1925; no mesmo ano, fundava, com Emílio Moura e outros escritores mineiros, o periódico modernista A Revista. Em 1934 mudou-se para o Rio de Janeiro, onde assumiu o cargo de chefe de gabinete de Gustavo Capanema, Ministro da Educação e Saúde, que ocuparia até 1945. Durante esse período, colaborou, como jornalista literário, para vários periódicos, principalmente o Correio da Manhã. Nos anos de 1950, passaria a dedicar-se cada vez mais integralmente à produção literária, publicando poesia, contos, crônicas, literatura infantil e traduções. Entre suas principais obras poéticas estão os livros Alguma Poesia (1930), Sentimento do Mundo (1940), A Rosa do Povo (1945), Claro Enigma (1951), Poemas (1959), Lição de Coisas (1962), Boitempo (1968), Corpo (1984), além dos póstumos Poesia Errante (1988), Poesia e Prosa (1992) e Farewell (1996). Drummond produziu uma das obras mais significativas da poesia brasileira do século XX. Forte criador de imagens, sua obra tematiza a vida e os acontecimentos do mundo a partir dos problemas pessoais, em versos que ora focalizam o indivíduo, a terra natal, a família e os amigos, ora os embates sociais, o questionamento da existência, e a própria poesia.

Quadrilha

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou pra tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.